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abril 20, 2008

1968 - 40 anos depois
Por Antônio Capistrano

O grande cineasta italiano Bernardo Bertolucci realizou a pré-estréia no Festival de Veneza, (2004) na Itália, do seu filme "Os sonhadores", que trata do período mais fértil e inquietante do pós-guerra, que tem o seu ápice em 1968. Estou ansioso para assistir a esta película, por diversos motivos. Entre eles, ver como a genialidade de Bertolucci retrata um dos períodos mais transformadores do século XX, só comparado, a meu ver, com a bela época da década de 20 na Europa, e que, aqui no Brasil, foi também um momento de grande ebulição: o tenentismo, o fortalecimento do movimento operário, a criação do Partido Comunista Brasileiro, a Semana de Arte Moderna, tudo isso culminando com a Revolução de 1930, marco divisor da nossa história. Nesse filme, segundo a imprensa especializada, Bertolucci resgata a história e a importância dos fatos da geração/60, que tinha como característica a aglutinação das pessoas não pela idade, mas, sim, pela afinidade de idéias.


Eu vivi intensamente este período. Os anos sessenta marcam, de forma indelével, a minha vida, principalmente o ano de 1968. Ano da Primavera de Praga - sonho do socialismo democrático, da morte do estudante Edson Luís no Rio de Janeiro, da passeata dos 100 mil, os estudantes nas ruas, as barricadas de Paris, consolidação da figura mítica de Che após seu assassinato na Bolívia, em 1967. Também, ano do meu casamento. Eu estava com 21 anos, militante do Partido Comunista Brasileiro, estudava no Atheneu, freqüentador das Cocadas (Praça Kennedy), centro efervescente de todas as tendências ideológicas, espaço democrático da capital, encontro de todas as tribos; esquerda, direita e centro, dos existencialistas, leitores de Jean-Paul Sartre e de Albert Camuns. Dos católicos leitores do grande Alceu de Amoroso Lima ou do reacionário Gustavo Corção. Dos socialistas seguidores de Antonio Gramsci, Roger Garaudy, George Luckás, dos trotskistas, stalinistas, maoístas, fidelistas, leninistas, dos integralistas de Plínio Salgado, dos adeptos de todas as religiões e credos, os apaixonados pela Sétima Arte, os apreciadores de uma boa leitura, os torcedores fanáticos do futebol e dos fregueses dos bares da bela e inesquecível vida provinciana da nossa capital.
1968, ano que marcou a minha geração, que, como todas as gerações, era revolucionária. Geração que foi para as ruas na luta contra as repressões de todos os tipos, na busca de novos caminhos de liberdade e de justiça social. Geração que lutou contra as guerras, na defesa da paz em todo o mundo. Geração que gostava dos Beatles e dos Rolling Stones, que lutava contra a guerra do Vietnã e contra o racismo em todas as partes do mundo. Geração que adorava Glauber e o Cinema Novo, que vibrava com as composições de Vandré (Para não dizer que não falei das flores), e as de Chico (A Banda), as de Caetano (É Proibido Proibir), geração que admirava a Jovem Guarda através das canções do seu ídolo Roberto Carlos, que descobria na literatura os grandes escritores regionalistas - Jorge Amado com a sua famosa trilogia "Subterrâneos da Liberdade". Graciliano Ramos com seu estilo apurado, relatando o flagelo dos retirantes através do seu grande romance, "Vidas Secas". Rachel de Queiroz, mostrando com o "Quinze" a vida dos nordestino do semi-árido no período da seca. José Bezerra Gomes, retratando o Seridó dos algodoais através de "Ouro Branco". José Lins do Rego, o romancista do cotidiano dos canaviais, dos meninos de engenho, dos moleques ricardos, dos bangüês, dos engenhos, das usinas e dos coronéis, donos do sertão nordestino. Guimarães Rosa com o seu "Grande Sertão: Veredas" obrigando-nos a consultar Nei Leandro de Castro, através do seu "Universo e Vocabulário do Grande Sertão", ensaio premiado pela ABL, que traduz a linguagem regional de Guimarães Rosa. Geração que recitava poemas de Vinicius, Jorge de Lima, Bandeira, Drumonnd, João Cabral, Thiago de Melo, sem esquecer a poesia concreta e o poema processo de Moacyr Cirne, Anchieta Fernandes, Dailor Varela, Falves, Franklin Capistrano e Haroldo de Campos. É essa a geração/68 que Bertolucci resgata, geração que, como diz a canção, "sem lenço e sem documento", rompeu barreiras e quebrou tabus, preparando o mundo para um novo século e um novo milênio.

Posted by Sandino at abril 20, 2008 01:36 PM

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